quinta-feira, 23 de maio de 2013

DESCRIÇÃO DE PESSOAS: MARIA, MARIA


MARIA, MARIA

          Quando a vi pela primeira vez praticamente nem a vi. As pessoas, em sua maioria, não costumam prestar muita atenção às varredoras de rua. Mas Maria parece não se importar com isso, porque também não presta muita atenção às pessoas que passam pôr ela, uma vez que está sempre olhando para baixo, à procura do que varrer.

          É baixa e magra, como convém a alguém que sempre comeu muito pouco, e sua pele tem a coloração típica dos que tomam sol, chuva, mormaço, ou qualquer coisa que não se possa escolher ou evitar. Seus cabelos crespos e negros parecem encolher-se ainda mais, para não sofrerem a ação do vento impregnado de poeira e poluição. Olhos amendoados, também negros, sem brilho: inexpressivos. Com certeza refletem a sensação de que é inútil expressar-se, seja para reclamar de qualquer coisa. Mas são olhos duros, de quem protesta, pelo silêncio, contra a dor ou simplesmente contra o peso da rotina fatigante, cumprida à risca, para ninguém achar defeito. O nariz levemente achatado e os lábios grossos são a confirmação dos traços da raça. Boca fechada, apesar do muito que teria a dizer. Fechada, como se recomenda aos quer desejam manter o emprego, ainda que tão árduo.

          Maria tem habilidades manuais. Quando criança, queria ser costureira de lindos vestidos. Agora quer sobreviver de maneira honrada. Seu uniforme de funcionária da limpeza pública em nada se parece com os vestidos do seu sonho de menina. Ela deixa agora os sonhos para seus dois filhos, porque é a única coisa que pode deixar como herança. Isso é o exemplo da sua luta, da sua esperança que tira do nada.

          Exilada em sua própria cidade, pelo tempo que lhe toma o trabalho, quase não vê a família, mas persiste e acima de tudo acredita, pois “quem traz na pele essa marca possui a estranha mania de ter fé na vida”.

( BRANCA GRANATIC )



Nenhum comentário:

Postar um comentário