sexta-feira, 31 de maio de 2013

CONTO + ANÁLISE

A SAGA DOS CARECAS
(WALCYR CARRASCO)

Ser careca é um drama. Pessoalmente, não acredito que, por falta de cabelos, alguém seja mais ou menos charmoso. Mas as pessoas adoram fiscalizar. Tenho duas entradas desde os 20 anos de idade. Nunca aumentaram. Basta ficar sem ver alguma amiga alguns meses para ouvir:
– Ih... Você está ficando careca?
– Não, sempre fui assim.
Ganho um sorrisinho de dúvida. Piadas não faltam. Tive um tio com uma calva pronunciada. Passou a vida toda recebendo mimos:
– E aí, como vai o aeroporto de mosquito?
– Já lustrou?
Durante muito tempo não imaginei o desconforto. Só minha tradicional falta de tato me apontou a seriedade da questão. Um amigo estava passando um remédio caríssimo, último lançamento. Três fios solitários espetados no alto da cabeça. Todos os dias ele se mirava no espelho, esperançoso.
– Estão nascendo, estão nascendo!
Até que eu disse:
– Por que não junta os três e faz uma chuquinha, bem para cima?
Olhar de ódio absoluto. Nunca mais brinquei. Passei os anos seguintes tentando ser solidário.
– Puxa, já tem quatro fios! Que bom, parabéns!
Ou:
– Tenha paciência. É que nem horta. Tem de plantar, adubar, esperar crescer... Um dia a colheita vem!
Na praia o dito-cujo passava protetor solar na pele reluzente!
Em compensação, há quase um MSC – Movimento dos Sem Cabelos. Outrora criaram um refrão: "É dos carecas que elas gostam mais...". Propaganda, sem dúvida. Falando francamente, nem sempre os carecas ajudam. Inventam estratagemas.
Alguns deixam o cabelo crescer de um lado e depois penteiam por cima da calva. Fica estranhíssimo, com os ralos fios tentando superar o deserto do topo. Outros apelam para uma franja comprida, que começa atrás das orelhas e cobre toda a frente. Se bate vento, é uma revelação! E os que botam aquelas meias perucas modernas? Depois de instaladas, recebem um corte semelhante ao dos cabelos, para dar a impressão de uma única e viçosa plantação. Sempre há uma franja juvenil, mas milagre ninguém faz. Com o tempo, os cabelos normais crescem. A peruca, não. Resta o topo certinho. Em torno, um jardim selvagem!
Massagens. Estímulos para abrir os vasos capilares. Extratos vegetais capazes de deixar um odor estranho por semanas! Implante? A calva é preenchida com uns tufos ralos, à espera de que floresçam. Deve ser mais fácil plantar soja! Um tratamento puxa a pele de trás para a parte da frente da cabeça. O redemoinho fica na altura da testa! Um amigo lançou mão de um artifício trágico: pintou a calva de preto. Encontrei-o de noite e fui enganado:
– Como conseguiu?
Da vez seguinte nos cruzamos em um shopping, de tarde. Vi a tinta! Parecia quase... piche! De perto, era horrendo. Procurei agir educadamente, o que é horrível nesse tipo de situação. Tentava desviar os olhos. Quando dava por mim, estavam pregados na área asfaltada!
Admiro quem assume a calva. Vários amigos raspam a cabeça toda. É um estilo. Também não fica mal quem deixa a careca aparecer, rodeada por cabelos. Sem disfarce.
Depois de certa idade, os pelos nascem por todos os lados. Nas orelhas. No nariz. As sobrancelhas transformam-se em taturanas. Para muitos homens, dá para fazer trancinhas rastafári no peito! Sem falar de outras áreas inomináveis. Só não nasce cabelo na cabeça!
Eu me solidarizo com os carecas. A genética, de fato, é bem injusta para com a vaidade humana!         
  
Análise do Conto
O tipo de análise aqui proposto segue as características próprias do conto, que para facilitar, decidiu-se pelo preenchimento de itens semelhantes a fichários.

1-    Enredo: O autor narra de uma forma bastante humorada, o drama de quem é careca.
2-   Narrador: 1ª pessoa.  ( ‘...não acredito que, por falta de cabelos, alguém seja mais ou menos charmoso...’ ); (‘...Tenho duas entradas desde os 20 anos de idade...’); (‘...Durante muito tempo não imaginei o desconforto...’).
3-   Época Narrada: Percebe-se através dos seguintes elementos fornecidos pelo texto: Protetor Solar – introduzido no Brasil em 1984 pela Johnson & Johnson; Implante de Cabelo -  apesar de ter surgido no final da década de 1960,  tem seu apogeu a partir do século XX; Shopping Center – Iniciou-se no Brasil em 1966 (em São Paulo), hoje, esses estabelecimentos comerciais são inúmeros, principalmente nas grandes cidades e já fazem parte do dia a dia das pessoas; Genética- Gregor Mendel (1822-1884) é considerado o pai da genética - embora não a tenha chamado assim -, tendo publicado seus experimentos com ervilhas (Pisum sativum) em 1866,  Em 1905 W. Bateson deu a essa ciência em desenvolvimento o nome de “Genética”, em referência ao termo grego correspondente a “gerar”. Porém, a divulgação dessa ciência teve ênfase no século XX.
4-   Espaço/Cenário: O autor sugere varias situações ocorridas com parentes e amigos carecas em vários lugares, porém ele  cita apenas dois episódios ocorridos na praia e no shopping center.
5-   Protagonista: Não há efetivamente protagonista, mas pode-se dizer que são todas as pessoas carecas e que no texto são estereotipadas por parentes e amigos do escritor.
6-   Período Literário: Este Conto pertence a Literatura Pós-Moderna surgida desde 1945 .
7-   Mensagem:  Se as pessoas carecas assumissem a calvície, não precisariam passar por situações dramáticas.
8-   Tema: O drama das pessoas carecas .
9-   Crítica: A discriminação aos carecas, muitas das vezes vem deles mesmos que por não aceitar a calvície  recorrem a  vários meios, muitos deles até ridículos, piorando ainda mais a situação.

10-Verossimilhança:  O que se passa no conto , acontece também na vida real.

( Autor desconhecido )

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